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A Lei de Ambiente de Negócios e o processo de execução

Publicado em 04 Março 2022

Lei de Ambiente de Negócios

Implantada com o intuito de dar maior celeridade e simplificação aos procedimentos negociais, a Lei de Ambiente de Negócios também cuidou de deliberar sobre Processo Civil, especialmente na sua fase de execução. Estabeleceu a figura do SIRA (Sistema Integrado de Recuperação de Ativos) e disciplinou regras relativas à prescrição intercorrente.

O SIRA externa um propósito certeiro de unificação. Promete centralizar informações patrimoniais interessantes à recuperação de ativos, sob a governança da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. Quando implantado o sistema, haverá um nível de acesso privado, permitindo com que qualquer interessado acesse as informações possíveis de obter de modo público (Detrans, por exemplo), como também existirá um nível superior para verdadeira varredura de bens dentro de um processo judicial.

Ainda que o foco seja auxiliar a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, principal “cliente” do Poder Judiciário dentro de demandas executivas, a própria dicção da Lei n. 14.195/2021 autoriza o seu emprego em demandas envolvendo exequentes privados. Quando implantado o sistema, o que se dará por ato normativo suplementar, será criada ferramenta em prol do exequente em sua demanda. Evidente que a sua criação não suplantará a frustração do devedor destituído de patrimônio, mas a unificação de informações deixará a demanda, ao menos, mais previsível. 

Elogios à parte ao SIRA, não se pode deixar de registrar a despreocupação legislativa em estabelecer um sistema de recuperação internacional de ativos, o que, timidamente, a jurisprudência em decisões isoladas, já tem colocado em prática. Vale referir que essa máxima foi contemplada na alteração da Lei n. 11.101/2005, estabelecendo-se a figura da insolvência transnacional. Seria o momento de se estabelecer meios para localização e bloqueio de bens no exterior, evitando-se fuga patrimonial pelo Executado.

Se por um lado, a Lei de Ambiente de Negócios implantou ferramentas interessantes ao Exequente, em outro prisma disciplinou e reforçou a incidência da prescrição intercorrente no processo executivo, o que favorece o Executado.

A Lei de Execução Fiscal, cuidou de lançar a ideia da prescrição intercorrente ainda em 1980, dispondo degraus de viabilidade da pretensão executiva fiscal, que uma vez não satisfeita, estaria fadada à extinção. A jurisprudência cuidou de aplicar uma analogia favorável ao executado, empregando a Lei n. 6830/80 para outras demandas de natureza civil. O CPC de 2015 definitivamente trouxe a sua consagração a todos os processos, cabendo agora à Lei de Ambiente de Negócios esmiuçar alguns detalhes de aplicação do instituto.

A não localização de bens penhoráveis gera a suspensão do processo por 01 ano, permitindo ao exequente um prazo de “esperança”. Com a fluência dele, os autos serão remetidos ao arquivo provisório, onde ficarão “hibernando”, podendo ocorrer o desarquivamento a qualquer tempo, por iniciativa do Exequente.

Nesse proceder, a primeira alteração imposta pela Lei de Ambiente de Negócios: havendo uma primeira tentativa de localização do devedor ou de bens penhoráveis, a suspensão se dará uma única vez, pelo prazo máximo de um ano, conforme prevê a modificação. 

Esse proceder evita pedidos sucessivos de suspensão pelo Exequente, frustrando a incidência da prescrição intercorrente. Era costumeiro que o Exequente buscasse restabelecer o curso do processo, não obtendo êxito na localização de bens, fazendo com que se operasse uma recontagem do prazo a cada tentativa, ainda que frustrada. O processo era retomado e suspenso, periodicamente, não permitindo que a extinção se operasse.

Também a Lei de Ambiente de Negócios consagrou a disciplina da Súmula 150 do STF, consistente em estabelecer o mesmo prazo para o exercício da ação, para a incidência da prescrição intercorrente dentro de um processo executivo em curso. 

Por fim, importante referir a previsão concernente à extinção do processo pela prescrição intercorrente, que ocorrerá sem qualquer ônus para as partes. Essa disciplina fulminará com o inusitado entendimento de se extinguir a execução, condenando-se o exequente nas verbas sucumbenciais do patrono do executado, que, por vezes, sequer alegava a prescrição intercorrente.

É visível nas alterações acima citadas, o antagonismo entre a efetividade do ferramental destinado ao Exequente, que ainda carecerá de implantação e regulação, e as regras da prescrição intercorrente, que vigente de plano, permitirá verdadeira limpeza nos servidores do Poder Judiciário.

Certo que a própria Constituição Federal veda penas de caráter perpétuo e estabelece os vetores da dignidade da pessoa humana, razoabilidade e proporcionalidade. Logo, não se justificaria alongar a marcha processual executiva por toda uma eternidade, a bel prazer das suspensões impugnadas pelo Exequente. Mas, no entanto, a referência genérica e a incerteza de implantação do SIRA, deixa certo o favorecimento do lado do Executado. 

Atualmente, a miríade de sistemas existentes e seu acesso limitado a alguns Exequentes (lembre-se aqui dos litigantes no Juizado Especial, sem o assessoramento advocatício), deixando tortuoso o caminho até o patrimônio do devedor. Portanto, se o objetivo da alteração legislativa fosse melhorar o “ambiente de negócios”, essa benesse também deveria considerar a recuperação de crédito, um dos fatores de saúde empresarial e credibilidade internacional para um país de matiz liberal, tal qual se adjetiva o Brasil.

As alterações havidas possuem um contorno muito mais voltado à política judiciária, ávido por extinguir demandas inviáveis. Novamente a conta é passada ao Exequente e de forma paralela ao seu patrono, que com a prescrição intercorrente, não receberá os seus honorários sucumbenciais. 

Urgente que o SIRA seja implantado e utilizado, de modo que as alterações da Lei de Ambiente de Negócios deixem de privilegiar, preponderantemente, o Executado. A demora levada distancia o processo do princípio da eficiência e gera uma sensação de impunidade ao Executado, que, por vezes, apenas aguarda a prescrição intercorrente para renascer patrimonialmente.

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