A substituição da garantia em ações judiciais, notadamente a substituição de dinheiro por fiança bancária ou seguro garantia judicial é assunto recorrente que – no cenário atual – tem assumido protagonismo nas agendas das empresas e de seus gestores.
A indisponibilidade de recursos financeiros tem imposto aos empresários o desafio de buscar medidas capazes de mitigar os efeitos da forte queda de suas receitas e do agravamento das condições para obtenção de crédito bancário.
Dentre as poucas opções atualmente disponíveis, a substituição da garantia prestada em dinheiro – quer por meio de penhora ou por depósito judicial – por outras garantias menos gravosas e igualmente satisfatórias do ponto de vista da segurança do credor, se apresenta como alternativa a ser considerada.
O Poder Judiciário, de seu turno, tem se mostrado atento e sensível a pleitos dessa natureza, reconhecendo seu dever de – no âmbito de suas atribuições e do quadro normativo fático específico – levar em consideração as dificuldades atuais na aplicação e interpretação da lei, contribuindo na medida de suas competências para auxiliar na construção de soluções possíveis.
Foi exatamente nesta linha que, já no início da pandemia, o Conselho Nacional de Justiça, ao julgar o Procedimento de Controle Administrativo n.º 0009820-09.2019.2.00.0000, anulou os artigos 7.º e 8.º do Ato Conjunto TST/CSJT/CCSJT 1/2019 que vedam o uso de seguro garantia judicial e fiança bancária em substituição ao depósito recursal e para garantia em ações trabalhistas.
A questão, inicialmente restrita ao âmbito da Justiça do Trabalho, foi estendida, na medida em que o voto vencedor, do Conselheiro Mario Guerreiro, concluiu que a substituição das garantias permite que os depósitos possam ser movimentados, liberando recursos para que as empresas possam aplicar nas suas atividades, para incremento da produtividade, geração de empregos, investimentos e riquezas.
Nessa decisão, com substrato jurídico robusto, há conclusão no sentido de que o seguro garantia judicial é um instrumento idôneo de caução processual, previsto no artigo 835, §2.º do CPC/2015, que deve ser mais e melhor explorado, uma vez que ostenta o atributo da liquidez e agrega características que, de um lado, asseguram o interesse do credor (e a efetividade da satisfação do seu direito) sem, de outro, sacrificar demasiadamente o devedor.
É oportuno lembrar que a base jurídica está bem sedimentada no CPC de 2015, que cuidou de equiparar o dinheiro à fiança bancária e ao seguro garantia judicial ao menos para a substituição de penhora (artigo 835, §2.º) e, embora o depósito em dinheiro esteja em posição privilegiada na ordem de penhora, há espaço para que os pleitos dessa natureza encontrem terreno fértil para prosperar.
Em decisão também recente, a 3.ª Turma do Superior Tribunal de Justiça reafirmou esse entendimento, pacificando a compreensão no sentido de que o seguro garantia judicial produz os mesmos efeitos jurídicos que o dinheiro, seja para garantir o juízo da execução, seja para substituir outro bem que tenha sido penhorado anteriormente.
Agrega-se agora, à solida fundamentação legal já existente sobre o tema, um elemento determinante a servir de motivação para que essas questões, já entregues ao Poder Judiciário, sejam revistas ou enfrentadas pela primeira vez.
A crise que alcançou a todos mostra sua face mais perturbadora nos números crescentes de empresas obrigadas a fechar as portas, demitir funcionários e inadimplir contratos, expondo um abismo de mazelas na atividade empresarial que, sem socorro, tardará em se recuperar.
A alternativa de buscar a substituição de garantias em processos judiciais, portanto, desde que possível a demonstração da necessidade dos recursos neste cenário atual, pode e deve ser considerada como remédio rápido para a injeção de recursos capazes de representar o fôlego necessário para prosseguir, ao menos, temporariamente.
Para ler a decisão, acesse:
https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1936329&num_registro=201900975133&data=20200521&formato=PDF